Domingo, 13 de agosto de 2013, 20h30 – lua minguante
Domingo, 13 de agosto de 2013, 20h30 – lua minguante
Escrevo em diário desde os 13 anos de idade, quando tudo já era intenso e eu sempre ansiosa por me expressar. Desde criança sou curiosa, comunicativa, alegre e “justiceira” – daquelas que protegia as pessoas oprimidas, inclusive eu mesma, sentando o sarrafo em quem fazia bullying comigo. Sorrio ao me lembrar disso. Trouxe essas características sobre mim para dizer que, por tudo isso, ao meu redor sempre tive pessoas para compartilhar, falar e ouvir, as experiências da vida, alguns pensamentos, impressões. Mas, em algum momento, eu entendi que tinha coisas particulares minhas que só cabiam num caderno e que ninguém pudesse saber, inclusive alguns poemas que comecei a escrever ainda bem jovem, e parei quando adulta… A vida tem dessas coisas…
Nesta Coluna/Diário, obviamente, escreverei sobre mim e meu ofício de editar livros escritos por mulheres e fazer dessa prática minha contribuição na luta feminista para mudar o mundo. Sim, é isso que as feministas, todas, queremos, mudar o mundo.
Hoje tenho 37 anos, guardo mais de 50 cadernos (além do inacabado atual) onde escrevi somente para mim mesma – hoje bem menos que ao longo dos primeiros 15 anos de escrita em diário –, escolhi fazer graduação em Letras para estudar Literatura e tomei para mim, como ofício e práxis feminista, editar livros. Sim, me tornei EDITORA. Mas não somente uma editora, me tornei uma ativista feminista no fazer editorial (outro dia escrevo sobre as especificidades disso, que inclusive é meu tema de mestrado). Fundei, em 2019, a Editora Luas, que tem um projeto editorial feminista de publicar exclusivamente textos escritos por mulheres, de trabalhar prioritariamente com elas, de, assim, contribuir para a circulação de livros contemporâneos de literatura; livros antigos, de nossas antepassadas (reeditá-los); livros de não ficção que discutem temáticas feministas; e livros para as infâncias.
Fiz toda essa apresentação, porque sei que é um diário aberto, público, e sempre preciso (e adoro!) contextualizar rs.
Mas, o que quero “desabafar” mesmo aqui, neste espaço, é um certo cansaço… Cansaço acumulado diante de tantos afazeres por ser uma editora que tem uma equipe de duas pessoas – eu e minha irmã maravilhosamente incrível, Dani, que é responsável pela parte que sou desesperadamente ignorante: administrativo, financeiro, comercial, estoque e criação das artes de divulgação. Cansaço por enfrentar solitariamente, sabendo que muitas mulheres editoras estão como eu, as dificuldades de ser uma editora independente, pequena, mas que sonha grande grande. Cansaço por ansiar tantas publicações e ter limitação de caixa, e por isso ter de adiar ou mesmo abrir mão de algum projeto ou publicação incrível. Cansaço por estar num contexto econômico tão desfavorável para vivermos minimamente bem – nós, trabalhadoras/es de modo geral, mas destaco aqui as trabalhadoras do livro – e para nossos projetos editoriais serem autossustentáveis.
Me sinto muito muito cansada… de ter de cuidar da Luas em tantas frentes sozinha e pegar muitos freelas, prestar serviço para outras editoras, porque a Luas não se sustenta ainda, muito menos a mim… Outro dia escrevo aqui tudo que faço… hoje me sinto tão cansada que só de lembrar já cansei mais…
Ao mesmo tempo, ainda tenho muitos sonhos dentro de mim… parafraseando o poeta meu irmão gemini, o Pessoa… E sou uma eterna entusiasta de que devemos executar nossos sonhos, desejos, por mais difícil que pareça. Acho mesmo que toda pessoa que queira fazer livros, abrir uma editora, deva fazer, principalmente se for uma mulher…
Li algo muito bonito e forte hoje, da María Lugones, e vou reproduzir aqui – hoje escreverei pouco, outro dia, em que estiver menos cansada, escrevo mais – para finalizar o dia de hoje com esperança:
“Não se resiste sozinha à colonialidade do gênero. Resiste-se a ela desde dentro, de uma forma de compreender o mundo e de viver nele que é compartilhada e que pode compreender os atos de alguém, permitindo assim o reconhecimento. Comunidades, mais que indivíduos, tornam possível o fazer; alguém faz com mais alguém, não em isolamento individualista. O passar de boca em boca, de mão em mão práticas, valores, crenças, ontologias, tempoespaços e cosmologias vividas constituem uma pessoa” (Lugones, María. Rumo a um feminismo descolonial).
Um dia de cada vez, sempre e todo dia. Continuarei. Continuemos.
Avante, hermanas!
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Cecília Castro – Fundadora e diretora editorial da Editora Luas. Nasceu no norte de Minas, é feminista, ativista, apaixonada por livros, poesia e literatura.