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Entrevistas

O resgate histórico de obras escritas por mulheres e a importância do movimento feminista – Entrevista com Constância Lima Duarte

(Elaboração e realização: Patrícia Lessa e Andrea Conceição – entrevista realizada ao vivo via meet e transcrita depois.)

Nossa entrevistada do mês é a professora e pesquisadora Constância Lima Duarte. Ela possui graduação em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais (1973), mestrado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1980), e doutorado em Literatura Brasileira pela Universidade de São Paulo (1991). Cumpriu programas de Pós-Doutorado na UFRJ e UFSC (2002-2003). Aposentada pela UFRN em 1996, ingressou como professora de Literatura Brasileira na Faculdade de Letras da UFMG em 1998, aposentando-se em 2005. Atualmente, é professora voluntária junto ao Programa de Pós-Graduação em Letras – Estudos Literários, da UFMG. Tem experiência na área de Literatura Brasileira, com ênfase nos seguintes temas: literatura de autoria feminina e crítica literária feminista. Dentre as publicações, destacam-se Nísia Floresta: vida e obra; Mulheres em Letras – Antologia; A escritura no feminino; Mulheres de Minas: lutas e conquistas; Dicionário de Escritoras Portuguesas; Dicionário de escritores mineiros; Escritoras do Rio Grande do Norte – Antologia; Imprensa feminina e feminista no Brasil, século XIX, entre outros. Atua como pesquisadora junto ao NEIA – Núcleo de Estudos Interdisciplinares da Alteridade, ao Centro de Estudos Literários e Culturais, da UFMG, e coordena o Grupo de Pesquisa Letras de Minas, cadastrado no Diretório dos Grupos de Pesquisa do CNPq. Atualmente, compõe o Conselho Editorial da Editora Luas e é uma das curadoras da nossa Coleção Precursoras (Conheça a Coleção aqui).

 

1 – Constância, em sua trajetória, vemos que exerceu trabalhos e pesquisas em diferentes regiões do Brasil e em diferentes universidades, tais como Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Universidade Católica do Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade Federal de Santa Catarina e Universidade de São Paulo. De que forma estas experiências contribuíram para a sua formação? Os cursos de pós-doutorado na UFRJ e na UFSC trouxeram quais novidades para as suas pesquisas?

Constância Lima Duarte: Essas universidades representam, cada uma, diferentes momentos da minha vida. Como já estava dentro de mim, entranhado em mim o desejo de investigar a história das mulheres, de conhecer as pioneiras da nossa literatura e de compreender essas nuances do movimento feminista, em todas essas instituições eu desenvolvi pesquisas sobre essas temáticas. Por exemplo: sobre Nísia Floresta, no Rio Grande do Norte, comecei lá e terminei na USP. À Nísia Floresta, nossa primeira feminista, dediquei anos de pesquisa, e continuo dedicando, e também às antigas escritoras da literatura nordestina. Sobre as antigas escritoras da literatura mineira, me dedico desde quando cheguei aqui na UFMG, enfim, tenho alguns livros sobre elas. Por fim, a história do feminismo, que também sempre me interessou. Eu adoro conhecer, saber histórias daquelas loucas, utópicas mulheres antigas que enfrentaram os preconceitos de seu tempo de peito aberto, destemidas. Eu fico pensando assim, onde é que elas encontraram tanta coragem? Porque as histórias que a gente vê da Maria Lacerda de Moura, Ercilia Nogueira Cobra, anarquistas, eu estou citando anarquistas. Naquele momento escrever “Virgindade Inútil e Anti-Higiênica”. Imagina uma novela com esse nome nos anos 20? “Virgindade inútil”! É louca! É de uma utopia inimaginável. Então eu adoro saber histórias dessas mulheres. Maria Lacerda de Moura tem um livro, ela é de Barbacena, ela é mineira, ela teve jornais e tudo, ela tem um livro “Amai e… Não Vos Multipliqueis”. Imagine falar isso nos anos 20? “A mulher é uma degenerada?”, ela põe uma pergunta. O mundo cientista tinha falado que a mulher era louca e degenerada, aí ela faz uma pergunta “a mulher é uma degenerada?”, e então ela vai responder nesse livro. Então são personalidades que nós tivemos na nossa história que são incríveis, eu fico então pesquisando.

 

2 – O seu livro: Nísia Floresta: vida e obra é uma importante contribuição para o campo dos estudos feministas, das biografias e o campo da literatura de autoria feminina, como foi a recepção dele no meio acadêmico?  

Constância Lima Duarte: Nísia Floresta é uma querida, foi meu tema de tese de doutorado que defendi na USP, em 1991. Na época, eu morava em Natal e me incomodava muito ver o pouco ou nada que sabiam sobre ela. A verdade era essa. Foi isso! Eu botei na cabeça que ia pesquisar Nísia Floresta. Não havia nada em Natal, no Rio Grande do Norte, nenhum livro dela.

Na época dessa tese, nos anos de 1980, quando comecei a pesquisar a Nísia, em 1984, eu viajava e procurava sobre a Nísia Floresta. E não havia nada sobre ela. Quer dizer, havia histórias: “Dizem que publicou muitos livros”… Outro falava assim: “será que foi ela que escreveu?”, “Será que é dela?”, “Dizem que ela teve muitos amantes na Europa”. Então aquelas histórias desencontradas. É como se naquele tempo tivesse um mito em torno de Nísia, a mulher mais brilhante das nossas letras, as pessoas falavam assim. Outros diziam assim “Era uma puta erudita”. Então havia um estigma também. Porque não conheciam nada. E quando se quer ofender uma mulher, vai pela moral, né? Para pesquisar sua obra, ninguém nem sabia quantos livros ela tinha publicado. Eu fui visitando bibliotecas e acervos por todo o país. Aproveitava minhas férias e ia para Recife, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre, onde ela morou, em várias cidades e estados do país, eu fui atrás das principais bibliotecas. Encontrava o mesmo livro. Não encontrava nada mais. Depois fui à Europa, porque ela viveu a metade da sua vida na Europa. Inclusive ela morreu e foi enterrada em Rouen, no interior da França. Lá nas bibliotecas da França, em Paris, em Florença, de Roma, eu encontrei edições de Nísia Floresta escritas em inglês, em francês, em italiano, que ainda não tinham sido nem citadas nos dicionários bibliográficos brasileiros. Ninguém sabia desses livros. Então, eu fui recolhendo livros dela e sobre ela, informações sobre ela nos jornais, nas notícias, encontrei o passaporte dela em um arquivo nacional da França. Foi assim que fiquei sabendo das viagens, das datas das viagens etc. E com essas informações valiosas, eu fui escrevendo a sua biografia. Há grandes lacunas, ainda assim. Há anos em que não sei onde ela estava nem o que ela fez. Alguém vai descobrir, eu espero que descubra. E, desde então, eu me dedico a reeditar. Já reeditei alguns livros dela. E me dedico a falar dela para quem quiser ouvir. Sempre que me chamam, sempre que querem, eu vou falar de Nísia Floresta.

Nísia nasceu em 1810 e morreu em 1885. Seu primeiro livro é uma tradução de um livro inglês que estava traduzido para o francês, que ela traduz do francês para o português, chamado “Direitos das mulheres e injustiça dos homens”. É o primeiro livro em língua portuguesa que chega aqui para nós que fala em direitos das mulheres. Adoro esse título! Você pergunta como foi a recepção dele no meio acadêmico. Havia uma curiosidade, um interesse. Eu costumo dizer que é como se Nísia estivesse no inconsciente coletivo de toda a feminista. Todo mundo parece que já ouviu esse nome, a impressão que eu tenho é essa. Então há muito interesse. E hoje, o feminismo que estamos vivendo, há uma nova onda, uma grande e forte onda. Podemos falar disso depois, e é nascente, é muito grande este interesse em saber sobre Nísia Floresta, por exemplo, sobre as primeiras feministas, as primeiras que tiveram ideias feministas.

 

3 – O livro: Imprensa feminina e feminista no Brasil: século XIX nos leva a pensar muitas questões, dentre elas: no século XIX quais eram as reivindicações das mulheres na imprensa? Quais as diferentes pautas das mulheres e daquelas que se declaravam feministas?

Constância Lima Duarte: Ótima pergunta, ótima questão. Eu costumo dizer que cheguei nos periódicos da imprensa pela literatura, porque, quando eu procurava as antigas escritoras, eu encontrava os títulos dos jornais em que elas tinham publicado, pois os jornais foram o primeiro veículo de divulgação do trabalho intelectual feminino. O primeiro não foi o livro, primeiro elas publicavam nos jornais, depois aparecia o livro. Às vezes ele nem aparecia… Obras inteiras eram publicadas nos jornais ao longo de anos. Então, foi a literatura que me levou aos periódicos. Nesse sentido, eu penso que as primeiras escritoras eram todas feministas, compreende? Porque eu sempre enxerguei no gesto de uma mulher publicar, tornar público um pensamento, uma opinião sobre qualquer coisa nos séculos XVIII e XIX, quando isso não era permitido, um gesto feminista. Achar: eu posso! Eu quero! Ir contra todos e tudo. Eu já parto por aí. As primeiras escritoras, só por terem sido escritoras, eram feministas, porque eu gosto de pensar no feminismo sempre no sentido bem amplo. Antes de ser um movimento organizado, articulado em grupos, visando à construção de um mundo que a igualdade de gênero seja uma realidade. Antes disso, o feminismo surgiu através de iniciativas individuais. E era um projeto feminista. Junta duas mocinhas, duas amigas, duas irmãs e vão formar um jornal para defender as mulheres, isso é feminismo, não é? Isso é feminismo. Então, eu cheguei nos jornais procurando as mulheres. Quer ver um exemplo de escritora, no século XIX, Emília Freitas. É uma cearense, bárbara, gosto muito dela. Ela tem um romance chamado A Rainha do Ignoto. Ignoto é o desconhecido. A rainha do desconhecido. O enredo é a história de uma sociedade de mulheres, e essa rainha traz as mulheres espancadas, sofridas, maltratadas para sua terra, é uma terra que ninguém vê, é uma sociedade escondida, desenvolta, e a função dessas mulheres é resgatar outras mulheres que estão em situação de opressão. Quer mais feminismo que isso? Não existe a palavra feminista, mas o romance é isso. A Emília Freitas, no livro, retrata as mulheres, aquela sociedade – uma era general, a outra era advogada, a outra era engenheira, a outra era médica, estavam em todas as funções – em que elas podiam tudo. Tudo que não existia no mundo real ela constrói no mundo ficcional, fictício.

Você pergunta quais eram as reivindicações das mulheres na imprensa. A primeira bandeira que está desde Nísia Floresta, em 1830, até no final do século XIX, é a educação. A luta pela educação feminina, para abrir escolas de meninas, para mudar e melhorar o ensino delas. Primeiro para abrir escolas primárias. Conseguem escolas primárias, em 1827, por meio da lei que autoriza a abertura de escolas para meninas nas vilas mais populosas: Salvador, Vila Rica, Recife, Olinda, Rio de Janeiro e outras. E essas escritoras, essas jornalistas, elas pleiteavam, elas ficavam em cima, querendo o melhor ensino, porque as escolas, quando foi permitido o ensino e a abertura de escolas para meninas, eram escolas que privilegiavam o ensino doméstico, a função doméstica; o futuro da menina era para ser dona de casa. Era um verniz de cultura que as meninas tinham: bordar, algumas palavrinhas de francês, para falar nos salões, pois eram meninas da elite, tocar piano para agradar, cantar, desenhar e ler, soletrar alguma coisa. Então, é engraçado isso, você observa, nas décadas de jornais, primeiro: abrir escolas para meninas, permitir que as meninas estudassem o primário. Logo começam a pleitear o ensino secundário. E muitas dessas jornalistas tinham escolas. Nísia Floresta teve uma escola em sua casa e depois um colégio, o colégio Augusto, no Rio de Janeiro, que tinha o primário e o secundário. Ensinavam línguas estrangeiras. Então foi assim: primário, secundário e universidade. Nos anos 70, 80, começam as mulheres a falar em permitir que as moças, as jovens, fossem para as universidades, as faculdades, porque isso não podia, na verdade.

 

4 – Você possui trabalhos e pesquisas dedicadas à emancipação feminina. Sobre isso, gostaríamos de perguntar: De que forma você acredita que a autoria feminina confere legitimidade frente ao processo de emancipação feminina?

Constância Lima Duarte: Eu penso que a autoria feminina é um dos mais importantes passos para dar legitimidade à emancipação. As mulheres podem escrever, concorrer a prêmios, pleitear reconhecimento nas academias literárias, e por aí vai. Então, eu considero a autoria feminina absolutamente necessária, fundamental para legitimar essa emancipação.

 

5 – Você acredita que as mulheres continuam sendo invisibilizadas na historiografia? Caso afirmativo, o que atribui a isso?

Constância Lima Duarte: Veja, se pensarmos em termos acadêmicos, eu estou pensando na minha área, a literatura, até bem pouco tempo, as disciplinas dos cursos de Letras estavam pautadas pelo cânone, que é majoritariamente masculino e branco. As poucas escritoras que estudadas, eram sempre as mesmas, que de certa forma também já estavam canonizadas – Clarice Lispector, Cecília Meireles, Lygia Fagundes Teles, e só. Raramente incluíam em disciplinas outros nomes como Raquel de Queiroz, Gilka Machado (uma anarquista), Hilda Hilst (outra anarquista). Porém, nos últimos anos, houve uma renovação do corpo docente da universidade. Todo curso é se renovou! Saíram os antigos e chegaram novas cabeças, jovens professores. E acredito que aconteceu em todas as áreas. A partir daí temos notícias de que muitas escritoras contemporâneas se tornaram objetos de cursos, de disciplinas, porque começaram a entrar nas aulas. Conceição Evaristo, Carolina Maria de Jesus, Maria Firmina dos Reis estão em alta nesse momento, e todas as três são negras, o que significa uma abertura inédita aos estudos literários, entende? É uma renovação revolucionária. O feminismo negro, por exemplo, tem suas pautas específicas. A mulher negra mais que nunca, porque está correndo atrás de um prejuízo. Ficou sem voz por muito tempo e de repente tem que falar tudo, fazer tudo. Veja, é esta questão: esse novo feminismo também entrou na universidade e provocou mudanças, virou tema de teses, dissertações, monografias. Conceição Evaristo está em alta, Carolina Maria de Jesus também. Maria Firmina, a primeira escritora brasileira, ficou absolutamente esquecida por décadas, muitas décadas, e de repente descobrem que foi a primeira mulher escritora negra a falar em abolição em nosso país. Poxa, não existe nenhuma história literária falando disso. Agora, isso está sendo dito em sala, compreende?

 

6 – Em 2020 vimos muitas iniciativas voltadas para a visibilidade da voz das mulheres nas artes. Como a criação de editoras e de livrarias voltadas para a escrita das mulheres pode contribuir para a valorização de suas vozes?

Constância Lima Duarte: Eu penso que a criação de tantas editoras de mulheres voltadas especialmente para esse nicho da literatura de autoria feminina é da maior importância, porque vai ampliar, de forma inédita, a produção das mulheres. Vai permitir um alcance, uma distribuição que ainda não temos como avaliar, mas eu acredito no potencial dessas “pequenas”, entre aspas, “pequenas editoras”, porque elas se somam. A Luas publica aqui, mas, agora com a internet, vende para qualquer lugar, outra em São Paulo. E assim elas vão se somando. Eessas editoras, no momento pequenas, vão se tornar gigantes, porque o nicho, o tema com que elas trabalham, a produção de autoria feminina, é tudo muito amplo e está absolutamente em alta. Eu acho que é excelente.

 

7 – A Editora Luas está anunciando o primeiro volume do livro: Memorial do Memoricídio, organizado por você e que sairá ainda em 2022, nos parece uma iniciativa bastante ousada. Poderia falar um pouco do projeto?

 Constância Lima Duarte: Claro! É um projeto que nasce do coração. É um projeto que pretende contribuir para divulgar escritoras que são pouco conhecidas, apesar das contribuições que deram em vida, apesar da produção intelectual que tiveram. É aquele conceito do memoricídio, porque (estou falando na minha área, da literatura), se você pega qualquer grande história da literatura brasileira, parece que não existe mulheres no século XVII, XVIII e XIX, só homens. Só os homens escreveram. Sim, era outra vida que as mulheres levavam, claro, mas, existiram as escritoras. Algumas, apesar de tudo e todos, apesar das limitações, do preconceito, algumas romperam esse preconceito, esse círculo vicioso em que estavam. “Mulher só tem que casar”, “mulher não tem que aprender a ler e escrever” etc. etc., e publicaram. Publicaram romances, contos, novelas, peças de teatro. Só que suas obras desapareceram, e quando eu falo de memoricídio, quer dizer, as mulheres sofreram, essas primeiras escritoras foram apagadas da história, foram apagadas da memória oficial, não entraram em livros nenhum, em dicionário nenhum. Se você olha nos grandes historiadores, parece que a  participação da mulher na literatura começou nos anos 1930. Os primeiros nomes que aparecem, em todos os livros, é Raquel de Queiroz, na ficção, e Cecília Meirelles, na poesia. De repente, eles não tinham mais como não ver, sabe? Estavam ali. As mulheres estavam publicando. Então, a partir dali começam a falar em mulheres. Poucas. Bem poucas. Mas começam ali.

Então, essa ideia do memorial, assim como o nome quer dizer, que é um monumento, é fazer um monumento. Eu acho que para quem é escritor/a, o melhor monumento é um livro. Foi isso que eu pensei com a Cecília, da Luas. Então, o Memorial do Memoricídio. O título é meu, eu gostei, porque a ideia é esta: eu convidei algumas colegas, fiz uma seleção de escritoras, de nomes de escritoras bárbaras, todas elas ótimas. Então, cada pesquisadora fez pequenas biografias de escritoras brasileiras, completamente, ou praticamente, desconhecidas da historiografia literária. Eu estou feliz com essa publicação. Eu acho que vai ser uma contribuição. Vão aparecer nomes ali que muita gente nunca ouviu falar e vai ficar surpreso/a. Como o exemplo que eu citei, da Emília Freitas, escritora fantástica, uma obra incrível que ninguém fala, que ninguém estuda. Então é isso, a ideia desse livro é ousada, eu concordo, eu acho também. Vai sair o primeiro volume do Memorial do Memoricídio, com quarenta escritoras, todas do século XIX para trás, e o volume dois está já sendo produzido também.

Então é isso, a ideia do projeto é contribuir para divulgar escritoras que não são conhecidas, ou praticamente desconhecidas, mas que merecem estar na história, porque também produziram. Também deram uma contribuição intelectual. Eu costumo falar com meus alunos e alunas que parece que a literatura brasileira só tem um lado. E é o lado que só homens escreveram, só homens brancos, sabe? Mas e as mulheres? Que história da literatura é essa? Cadê essas mulheres? Então, é o outro lado da literatura que a gente tenta mostrar.

                                                           Obrigada, Constância!

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As múltiplas Ana Elisa Ribeiro – Entrevista

Nossa entrevistada do mês é a professora e escritora Ana Elisa Ribeiro. Mineira de Belo Horizonte (1975), ela reside na mesma região desde a infância, numa história de afetos que remonta aos seus antepassados, quando da industrialização da cidade, no começo do século XX. Autora de mais de três dezenas de livros, Ana Elisa escreve poesia e prosa, para adultos e jovens, há mais de vinte anos. Os livros mais recentes de poesia são Álbum (Relicário, 2018), vencedor do prêmio nacional Manaus, e Dicionário de Imprecisões (2019, Impressões de Minas), finalista do Jabuti 2020. As pesquisas acadêmicas da professora têm focalizado o tema da edição de livros por mulheres, uma investigação necessária, já que há uma grande lacuna sobre essa história no Brasil. As perguntas que fizemos à poeta foram elaboradas por Lorrany Mota, estudante de Letras (Tecnologias da Edição) do CEFET-MG. 

1 – Ana, você, entre outras coisas, claro, é escritora, pesquisadora, professora, poeta… o que mais podemos dizer sobre você?

Dessas coisas listadas, eu gosto muito de ser escritora, que também pode ser uma decorrência de ser pesquisadora. Escrever é resultado de investimento, penso. Você lê bastante, repensa o lido, investiga mais, lê com motivações e objetivos diversos, termina por ter vontade de se expressar. Acho que sempre foi assim, no meu caso. E busquei fazer disso minha profissão. A poeta nasceu dessa vontade expressiva desde cedo, mas não sei se é, hoje, minha faceta mais convicta e nem sei se a levam a sério. Nunca me bastei, sabe? Eu achar que sou poeta ou escritora nunca foi o suficiente. Sempre prestei atenção aos sinais externos, e eles demoram, nem sempre são honestos, explícitos ou justos. Já a professora é meio incidental, no sentido de que não foi algo que pensei desde sempre, desde criança. Eu apenas descobri que escolhi na vida exercer trabalhos muito difíceis, pouco valorizados, e que, incrivelmente, o de professora era o menos difícil deles e garantia minha emancipação. Mesmo assim, fiz todo o possível para alcançar um posto de professora que não inviabilizasse minha vida de escritora. É muito difícil fazer isso, mas tenho conseguido parcialmente. E, claro, sem deixar de viver as funções de mãe de um adolescente, namorada, filha, irmã, tia-madrinha, amiga de algumas pessoas, colega de várias, tentando sempre ser generosa e colaborativa.

2 – Você está pesquisando sobre mulheres editoras no Brasil, por que essa pesquisa se faz importante? O que te motivou?

Atuei como editora alguns anos, antes de assumir de vez a vida de professora. Mantenho certa vida editorial, desde então. Sempre convivi com mulheres nos bastidores desse trabalho, mas nunca as vi protagonizarem um livro de memórias dos “homens importantes e influentes”. Lendo a monumental obra do Laurence Hallewell, O livro no Brasil, também achei curioso que as mulheres fossem muito timidamente citadas, às vezes sequer seus nomes completos apareciam, em especial se não estivessem no Rio ou em São Paulo. Uma coisa dessas só pode ser parcial demais, eu pensava. Estudei as escritoras por alguns anos, interesse íntimo meu como alguém que se projeta escritora, e não via referências a outras mulheres em cargos de direção e decisão. Em especial no século XX, a história é sempre contada sobre os homens relevantes, mesmo quando são contadas por pesquisadoras ou biógrafas. Bom, era evidente que poderia ser uma lacuna nessa narrativa. Passei então a procurar os vestígios dessas possíveis editoras, o que também era difícil, pois a ausência de material sobre elas as tornava invisíveis. Daí passei a procurar as fontes primárias, isto é, os acervos de escritores ou editoriais. Aqui e ali, é possível encontrar vestígios de mulheres que fizeram parte de processos editoriais relevantes. E fui vendo em que tempos elas atuaram, consegui encontrar algumas ainda vivas, passei a entrevistar, a conseguir livros meio raros, etc. O que me motiva é que me parece possível rasurar a história editorial e mesmo literária fazendo as devidas inserções. Não é tirar ninguém, não se trata de uma competição, nesse sentido. É dizer quem mais estava ali, naquele momento; quem mais participava e tomava também decisões; quem teve aquela ideia e executou aquele trabalho; que outras pessoas, em outros lugares, também faziam, pensavam, editavam. Considero isso suficientemente importante para ser feito. Tenho investido meu tempo de pesquisadora nisso e não estou só. Reuni um grupo grande de pessoas interessadas e conheci colegas em outros países que fazem algo semelhante. Para que este trabalho vá se consolidando, é necessário que mais pessoas o desenvolvam, publiquem, institucionalizem e jamais se esqueçam de que somos várias pesquisadoras, e que citar as colegas é ético e importante. São como “pegadas” que precisamos deixar e que, hoje, tenho dificuldade de encontrar, quanto mais atrás no tempo quero pesquisar.

3 – Sua experiência como escritora contribuiu para notar essa ausência de mulheres na edição?

Sim, claro. Minha experiência como escritora é mais da metade da minha vida, hoje. Só reitero que notava a presença das mulheres na edição, mas a ausência da narrativa sobre elas. Elas nunca estiveram ausentes disso. No Brasil, mulheres editam jornais pelo menos desde o século XIX (para mencionar apenas o período posterior à vinda da família real). Mulheres foram donas de tipografias importantes, depois de viúvas dos tipógrafos. Era muito improvável que elas não tivessem participação na edição de livros.

4 – No vídeo feito para o Rastros Lectores você utiliza o termo mulheres “inenarradas”, já no livro publicado pela Zazie Edições você utiliza “subnarradas”, poderia falar um pouco sobre essa escolha desses adjetivos? 

Na verdade, estou usando os dois e com sentidos um pouco diferentes. É que às vezes me incomoda um pouco a palavra “apagadas” porque elas sequer foram narradas, não foram “escritas”, embora tenham existido. No livro da Zazie eu tentei dar uma desdobrada ou uma refinada na ideia, sentindo-me dona da liberdade que o gênero ensaio me dá. As inenarradas são as que jamais foram narradas e deveriam; as subnarradas são as que são insuficientemente narradas (são apenas mencionadas, por exemplo, sem qualquer aprofundamento, às vezes listadas a par de uma fiada de nomes masculinos). Acho que isso me dá mais chance de dizer que penso que elas precisam entrar na história que se conta às pessoas, para que notemos que elas também construíram nosso país, nossa cultura, nossa bibliografia, nosso pensamento.

5 – Como está sendo realizada essa pesquisa? E como é feito o registro?

A pesquisa é feita com toda a precariedade a que estamos acostumadas e agora com ataques adicionais à área das Humanidades. Bom, minha pesquisa em fontes primárias (cartas) no Acervo de Escritores Mineiros da UFMG gerou muitas anotações, muitos escaneamentos e muitas anotações. Junto disso, a leitura de obras conseguidas a custo também ajuda a construir uma lógica para esta história. Em termos metodológicos, tenho investido em pesquisa bibliográfica, documental e em entrevistas. É um quebra-cabeça com as peças bem espalhadas. Vou trabalhando nos documentos, juntando os pontos e compondo o que espero ser uma narrativa próxima da coerência e dos fatos, embora seja minha visão e sem desconsiderar a faceta performática de documentos como cartas, por exemplo. Toda vez que encontro ou sou apresentada a um nome feminino em algum lugar, ele funciona como um link, um nó que me levará a uma personagem interessante. Foi assim que deparei com Lina Tâmega Peixoto, por exemplo, link dado a mim pelo querido pesquisador e doutorando Mário Vinícius. Lina foi uma poeta-editora (é recém-falecida) que ainda consegui entrevistar brevissimamente. Ela editou uma importante revista literária mineira/brasileira. Este é outro ponto que me incomoda: a história só é contada como brasileira por alguns que se acham mais “universais”; os outros, o que se acham mesmo outros, engoliram isso e talvez até se sintam “menores”, contam como história mineira, história isto ou aquilo, como se não fôssemos parte de uma história grande, maior, de um país inteiro, e que o alcance do que aqui acontece só tivesse importância ou impacto num raio de alguns quilômetros. O que Lina fez foi também importante para todos e todas, fez parte de um momento da história brasileira e latino-americana. Teve relação com fatos semelhantes em outras plagas, embora o mundo fosse, à época, anos 1940, muito menos conectado em tempo real.

6 – Quais são os principais problemas metodológicos para a realização dessa pesquisa até agora?

O primeiro problema metodológico é encontrar fontes. Se uma mulher não foi “registrada”, de alguma forma, em sua atuação de editora, como saber hoje? Então é preciso investigar, escarafunchar mesmo. Para encontrar muita informação sobre as publicações de Henriqueta Lisboa, por exemplo, tive de ler não as cartas dela, mas as de homens de sua época. Eles a mencionavam ou trocavam cartas com ela ou simplesmente contavam dela a alguém. Nesse sentido, é um percurso errático… que depende dos links que vão aparecendo. É um método hipertextual por excelência. Outro problema é que muitas dessas personagens estão vivas, já que esta história é recente, é do tempo presente, em especial quando decidimos pensar na edição de livros literários, que é meu caso. Vamos definindo o objeto, dando a ele um perfil mais claro, e aí as personagens e as fontes vão também ficando mais claras ou mais escassas. É uma alegria ter contato com uma mulher que editou nos anos 1940, mas pode ser difícil entrevistá-la, ter acesso, ela pode estar doente, por exemplo. Então é preciso ter muito cuidado e delicadeza. Escrever sobre essas experiências é emocionante, mas é também difícil. É muita responsabilidade e muito risco.

7 – A teoria feminista tem contribuído para as análises dessa pesquisa?

Estou mais preocupada com teorias da edição, o pensamento sobre as redes intelectuais, modos de ver a produção editorial, mas pensar em teorias feministas foi incontornável. A perspectiva de gênero era evidente na investigação que me propus e foi imprescindível ler, encontrar interlocução sobre isso, etc. Gosto muito de pensadoras feministas que se aproximam da discussão sobre ciência, fazer ciência e sobre a literatura. Também dos pensamentos decoloniais. Mas preciso ainda ler muito para que talvez esta sensação de confusão se amenize em minha cabeça.

8 – Você já tem uma média de editoras encontradas? Poderia citar algumas “precursoras” da edição? Algumas editoras contemporâneas?  De onde elas são?

Fiz uma pesquisa pela internet, um tempo atrás, e encontrei mais de 200 respostas de pessoas autodeclaradas editoras. Hoje é impossível de contar. Por isso é importante desenhar bem o perfil do que tem me interessado como “editora”. Nada impede que alguém estude as editoras que apenas se autoeditam, por exemplo, mas eu quero saber agora das que editam outros/as, apenas para citar um critério que tenho usado para chegar às fontes e às personagens que procuro. Em décadas anteriores, em especial no século XX, essas mulheres vão ficando mais raras, aparentemente, e aí é possível divisar razoavelmente algumas figuras que foram bem protagonistas, embora a decisão de narrar suas importantes histórias não tenha sido tomada à época. Vou começar pela professora e editora Zahidé Muzart, da editora Mulheres, em Santa Catarina. É interessante porque há toda uma peculiaridade na história dela e da casa editorial, um feito muito pessoalizado, uma relação forte com a universidade pública, grupos de pesquisa, etc. O que essa mulher e suas colegas fizeram foi impressionante, compondo um catálogo de mais de uma centena de títulos, entre obras literárias “resgatadas” e teoria feminista. Eram uma verdadeira janela para a teoria e o pensamento mundial sobre o tema. No livro do Hallewell, por exemplo, edição de 2005, Zahidé é apenas mencionada com o nome escrito errado, numa menção também meio periférica, lateral. Não, a visada tem de ser outra: o trabalho de Zahidé foi muito relevante para os estudos feministas e literários no Brasil e na América Latina. Isso foi dos anos 1990 até a morte dela, em 2014. Outra pioneira, como todas sabemos, é a Maria Mazarello, da Mazza Edições, que vem publicando, desde os anos 1980, obras de autorias negras, muito antes de leis, decretos, etc. É uma editora viva e que vem sendo narrada em livros de entrevistas ou biográficos. Pesquisadoras do futuro terão mais material, se tais fontes não ficarem perdidas e raras. Nos dias que correm são muitas mulheres editoras e tem sido impossível contar e acompanhar com precisão. Vamos fazendo o monitoramento de tudo o que surge e tentando registrá-las. Já fiz isso em alguns textos.

9 – Você está sempre produzindo, publicando. Teve produções “independentes”?

Quase todas. Meus livros de poesia são todos de casas independentes, desde 1997, quando saiu o primeiro. Tenho livros por casas mais comerciais, mas a maioria está em catálogos que nasceram dos anos 2000 em diante. Gosto desta experiência variada e implicada no cenário. É claro que nos anos 1990 era mais difícil encontrar editoras, eu conhecia muito menos gente e estava começando. Hoje é muito mais fácil, tanto porque há mais espaços de publicação quanto porque fui me construindo à medida que o tempo passou. Nunca deixei de publicar, não desisti (apesar das forças em contrário), fiz redes sociais e de afeto muito bacanas e de longa duração. Colaborei com muitas pessoas, empreendi também, fiz boas parcerias, me investi da função de pesquisadora desse cenário. Meu livro de 2008, o Fresta por onde olhar, é autopublicado, embora tenha lá um nome fantasia. Talvez seja minha experiência mais “independente”. Mas os outros são todos parcerias de variada natureza.

10 – Você se viu em uma posição de se assumir, mesmo que por um momento, como editora?

Várias vezes. Foi minha profissão, minha atuação profissional na carteira de trabalho, por alguns anos. De vez em quando, ainda atuo assim. Quando editei a coleção Leve um Livro, com o Bruno Brum e uma pequena equipe, era o que éramos. Gosto disso, posso fazer. Infelizmente faço menos do que gostaria.

11 – Recentemente, o grupo Mulher na Edição completou 1 ano, meus parabéns! Poderia comentar um pouco sobre o grupo e sobre a comemoração? Vocês lançaram um livro pela LED (editora experimental do CEFET-MG), “Escreva como uma mulher”, foi um espécie de livro coletivo não é isso? Poderia falar do processo e dessa sutil alfinetada?

Este grupo é uma grande alegria. Ele nasceu quando a Fapemig aprovou meu projeto de pesquisa, para o qual convidei como coordenadoras as professoras Paula Renata Melo Moreira e Maria do Rosário Alves Pereira, do CEFET-MG. Daí resolvemos sistematizar nossas leituras, os estudos, nosso contato, enfim, e pensamos: “vamos estudar um texto por mês?”. Daí nasceu o grupo de estudos e deixamos as portas abertas a quem quisesse acompanhar, participar. Para nossa alegria, várias pessoas aderiram a estes encontros. O grupo seleciona um texto mensal para leitura e o comenta num dia marcado. Fazíamos isso no campus, mas com a pandemia passamos a fazer virtualmente, o que ampliou muito nosso alcance. De repente, tínhamos mais de cem pessoas cadastradas, recebendo nossos textos, informes, dicas, etc. Gosto muito desse tipo de trabalho, que reúne pessoas e interesses, num clima de colaboração. Quando fizemos um ano, resolvemos oferecer algumas ações: oficinas e uma live com uma convidada muito especial, a professora Eurídice Figueiredo, da Universidade Federal Fluminense. Eu, Rosário e Renata propusemos cursos curtos e gratuitos, oferecemos, as pessoas se inscreveram e foi uma delícia. Do meu, que era de produção literária, surgiu uma coletânea de contos. A ideia não era publicar, mas ficou tão legal, as participantes se engajaram tanto, que a Renata me deu esse toque, disse que tinha de ser uma coletânea mesmo. Então fizemos. A Paloma Vidal, escritora argentino-brasileira, cedeu o conto dela, do qual partiu a oficina, e o volume ficou bem legal, diverso, com escritoras de várias partes do Brasil, estilos diferentes. Com o envolvimento de estudantes da graduação em Letras do CEFET-MG, foi possível tornar o volume um item do catálogo da LED, editora laboratório. O título da oficina e do livro é uma jogada com o escrever como uma mulher, pensando que pode haver um modo peculiar de fazer isso ou não; escrever com uma mulher, tanto porque a professora era eu quanto porque o conto motivador é da Paloma Vidal; também pensando nessa frase que ganhou as ruas “lute como uma garota” e suas muitas variações. É um título de muitas camadas, dimensões e cheio de provocação. Obrigada pelos parabéns! São coletivos também.

Conheça mais sobre os escritos e trabalho da Ana Elisa Ribeiro em seu site: https://anadigital.pro.br/

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Entrevista com Deh Mussulini

Entrevista via e-mail. Perguntas elaboradas por Cecília Castro – Editora Luas

1 – Deh, você foi a primeira autora publicada pela Editora Luas, com o livro de poesia “Todas as primaveras em mim”, como aconteceu o convite e o processo de produção do livro? Como você se sentiu?

Após um show meu que a Cecília, dona da editora foi assistir, veio o convite de fazer o que seria o primeiro livro da Editora Luas. Meu livro de poesia. Para mim foi muito inusitado!, eu nunca havia me visto como uma escritora, muito menos de poesia. Mas Cecília disse que os textos, as letras das minhas canções eram pura poesia. Engraçado que eu nunca havia pensado dessa forma, que minhas canções poderiam ser publicadas em um livro na forma de um livro poético. Então juntei escritos meus antigos, reli várias poesias e textos, alguns que viraram canções outros que apenas eram registros de um momento meu. Nesse movimento, fiquei muito inspirada (e extremamente grata), o que me incitou a escrever bastante. Muitos desses novos textos, poesias, prosas, entraram para o livro Todas as primaveras em mim.

2 – O seu livro é dividido em quatro Séries: Deusas, Eu, Natureza e Luas. Como foi o processo de construção do livro, seus critérios de seleção e organização dos poemas antes de entregar o material para a editora?

Acho que essa pergunta é quase uma continuação da pergunta anterior, então vou continuar a partir da resposta anterior…

No processo de buscar meus escritos e na inspiração de escrever mais textos, percebi que eles poderiam se agrupar em temas. Então, a primeira coisa que fiz foi agrupá-los por afinidade de assuntos. Interessante que foi um processo de autoconhecimento, pras estradas séries demonstraram meus principais pensamentos e vivências, também revelou meu universo de interesse. Dentro disso, selecionei os que considerei os melhores. Depois, passei para minha irmã Thamires, que é uma excelente escritora, para dar sua opinião, e para uma amiga, a Luana Aires, que considero uma grande poeta, para que ela também colocasse seu olhar crítico e sincero. É bom ter a opinião externa de pessoas que admiro muito o trabalho e que sei que teria paciência para ler um livro meu na caridade. (risos)

3 – Você se considera poeta? O que isso significa e como é ter consciência disso?

Hoje sim! A Editora Luas, na figura magnífica de Cecília, me levou a essa conscientização! Isso mudou radicalmente minha relação com minha própria palavra, com meus escritos. É empoderador! Arrisco dizer que me impulsionou a sonhar mais, no sentido literal, e a confiar mais na minha canção!

4 – Seu livro foi publicado no eixo “literatura contemporânea”, em uma editora que só publica mulheres… o que você pensa sobre isso e como isso dialoga com sua vida de mulher que está constantemente inserida em movimentos artísticos de mulheres/feministas?

É interessante quando eu percebo que na verdade eu sempre inseri a literatura no meu trabalho artístico/musical/feminista, pois foi a literatura feminista que me desenvolveu essa consciência do patriarcado. Foi uma frase que criei em uma hashtag #mulherescriando que impulsionou o maior festival de Compositoras do mundo: o Festival Sonora. E também a chamada desse festival que criei “A revolução virá pelo ventre” nos guiou em toda modulação e formulação desse festival que inspirou inúmeras mulheres e se desdobrou em dezenas de ações pelo Brasil! Fora meu trabalho musical que é todo inspirado nas mulheres e no movimento feminista com um cunho espiritualista… pois é… tá tudo junto e misturado no final das contas. (risos)

5 – Quais outras manifestações artísticas você traz para o mundo e quais projetos você já participou?

Acho que meu trabalho de música inserida nas terapias holísticas que trabalho é uma outra forma que criei de manifestação musical no meu universo pessoal. Usar a música como um instrumento para estabelecer a boa saúde mental para o público é algo que gosto muito.

E sobre outros projetos, nossa… já participei e participo de vários, mas destacaria: Coletivo Ana, Coletivo mulheres criando e InVentos.

6 – O que você diria para mulheres que têm um a sensibilidade para a escrita mas acham que o que escreve não é “bom”?

Se você for esperar achar que tá bom suas criações de uma forma geral para então publicá-las ou divulgá-las, isso nunca acontecerá. Vai com medo mesmo e com todas as imperfeições que você enxerga! O que não é perfeito nesse mundo e a busca da forma ideal é apenas mais uma faceta da procrastinação e boicota seu crescimento como pessoa, como mulher! Como diz Jodorowsky: “Todo lo que vás a ser, ya o eres. Lo que buscas ya está em ti.” ❤️

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“Todas as primaveras em mim”

Deh Mussulini, publicado em outubro de 2019 pela Editora Luas Belo Horizonte/MG.
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