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Domingo, 24 de setembro de 2023 – Lua crescente

27 de setembro de 2023 Posted by admin In Colunas

Domingo, 24 de setembro de 2023 – Lua crescente

Após cumprir as demandas de trabalho do dia (de freela e de casa), comecei hoje a ler uma edição de cartas da Virginia Woolf e Vita Sackville-West (Editora Morro Branco, 2023), que comprei ontem numa livraria de rua em BH. Elas foram amantes apaixonadas. Tem coisa mais inspiradora do que carta de mulheres apaixonadas? Li 40 páginas e quis vir aqui escrever um pouco – há dias tenho pensado nisso, mas não fiz.

Tanta coisa aconteceu do último texto para cá… em relação ao meu trabalho como preparadora e revisora (tem aparecido muitas demandas!), ao mestrado (cursos, congressos, simpósios, apresentações, encontros, lançamentos de livros…), tudo direta ou indiretamente girando em torno da Luas e do meu ofício de trabalhar com livros e estudar sobre eles e sobre as demandas feministas. Enquanto isso, na minha cabeça fica martelando o que preciso fazer para que a Luas tenha mais visibilidade, que venda livros, mas não só… (porque, pasmem, uma editora pequena não sobrevive financeiramente de venda de livros… E, poxa, a Luas é um projeto tão legal… E importante. Me apaixono todos os dias por esse projeto.) Como fazer uma das partes que tanto sonhei/sonho com a Luas acontecer, que é ser um lugar de encontro de mulheres que escrevem, profissionais da edição e da cadeia do livro, leitoras/leitores, para espairecer as dificuldades do existir e aprimorarmos os bons encontros a partir dos livros?

Ter uma editora, lançar um livro, abrir uma livraria, montar cursos etc., tudo isso é sempre um risco. Tenho pensado muito sobre isso. Tudo na vida é sempre um risco. Por que temos tanto medo? Ou melhor, do que tenho tanto medo?

Depois de um pouco mais de três anos fora de BH, volto a morar aqui, e sei que não quero viver nesta cidade como se morasse numa qualquer, ou seja, ficar trancafiada em casa, trabalhando loucamente no computador e pensando no tanto de coisas que quero fazer, imaginando, criando, mas também lamentando estar sozinha nessa (mesmo, de fato, não estando, pois tanta mulher me apoia, apoia a Luas – somos uma coisa só…), não ter dinheiro para concretizar tudo o que minha imaginação cria com a rapidez de um falcão em voo… rs.

O curioso é que, ao mesmo tempo, pela primeira vez, tenho tomado decisões para focar cada vez mais no que quero ser e fazer com a Luas, vislumbro isso com mais claridade e calma. Com certeza tem a ver com o que trilhei até aqui, com as experiências – boas e não tão boas – que me fizeram, em alguns momentos, focar, noutros, desfocar do meu projeto editorial feminista. E isso me assusta. Tenho propensão a me perder nos desejos dos outros… empolgadamente… ingenuamente… e isso não é justo com ninguém, não é mesmo?

Eu sempre quis fazer algo que transformasse o mundo e me transformasse o tempo todo, e a Luas faz isso comigo – é como uma filha, existimos juntas. E tenho refletido, criticamente, sobre a lente com que olho tudo o que me acontece e faço acontecer – pequenas transformações não seriam conquistas maiores do que penso ser? E, juro, não é só como um mecanismo para seguir em frente. É que, de fato, temos em funcionamento uma cultura cuja base e perspectivas são muito cruel, anti-vida, principalmente para as mulheres, pessoas racializadas e pessoas não homens-cis-hétero-branco. E precisamos estar o tempo todo atentas às armadilhas que nos fazem ver que o que fazemos, desejamos, criamos, somos (ou pretendemos ser) é pouco, ou menos, ou menor, enfim…

Sob esta lua crescente, começo a semana querendo fazer planos, colocar no papel, como diz… organizar as ideias, os desejos, para materializá-los. Abrir um espaço da Luas, juntar dinheiro, criar um clube do livro, grupo de estudos, podcast… encontrar, compartilhar, trocar… mudar o mundo todo um dia… um pouco… de pouco em pouco… como dá… hoje.

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   Cecília Castro – Fundadora e diretora editorial da Editora Luas. Nasceu no norte de Minas, é feminista, ativista, apaixonada por livros, poesia e literatura.